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Educação positiva: forças de caráter e a escola

A educação positiva é uma área voltada para o desenvolvimento das competências socioemocionais e habilidades para a vida. A competência socioemocional pode ser desenvolvida seguindo diferentes modelos. Entretanto, quando se fala em educação positiva, essa competência é ancorada nos princípios da psicologia positiva, a ciência do bem-estar e da autorrealização.


O modelo tem dois eixos que andam juntos: a educação para o bem-estar (condições para que as pessoas sejam mais felizes) e a educação para o caráter (favorecimento do desenvolvimento das virtudes e forças de caráter). Quando esses dois eixos são trabalhados na escola, acontece a educação positiva.


Um aspecto a ser ressaltado é que, idealmente, não se faz educação positiva usando um curriculum paralelo. Isso acontece porque a educação positiva objetiva formar e integrar no mesmo processo tanto o porteiro quanto o diretor da escola. Ou seja, objetiva abarcar toda a comunidade escolar. Assim, quando o secretário escolar, por exemplo, presenciar uma discussão de alunos no pátio, ele terá a capacidade de ajudar os estudantes a resolverem o conflito, usando habilidades socioemocionais adquiridas na própria vivência com a psicologia positiva.


A implementação de um currículo positivo é um trabalho extenso, portanto. Ele se dá ao longo dos anos, porque é transformativo, já que é necessário criar uma nova cultura escolar. Isso envolve também os pais, enquanto parte da comunidade escolar, para que as crianças possam continuar se desenvolvendo positivamente no ambiente familiar. Entretanto, essa participação englobando a família não deve ser confundida com a educação familiar, já que este é um tema para a parentalidade positiva baseada em virtudes.


Um dos benefícios da educação positiva é que ela ajuda a melhorar o relacionamento entre os estudantes. Os alunos também se tornam mais empáticos e desenvolvem um olhar mais atento para o coletivo, o que abre uma possibilidade para serem adultos mais conscientes.


Quanto aos aspectos individuais, há melhoria na mentalidade de crescimento, na resiliência, na autoestima, nas notas, na aprendizagem e nas provas para ingresso na universidade.

Aplicando educação positiva

Uma pesquisa realizada em escolas públicas e privadas em João Pessoa, com estudantes do sétimo ao terceiro ano, indicou que as vinte e quatro forças de carácter se correlacionaram positivamente com todos os fatores do engajamento escolar.

Elas contribuíram para melhorar a concentração dos alunos, a dedicação deles às tarefas e o vigor na realização de atividades. As forças que tiveram maiores pontuações foram gratidão, curiosidade, bondade e modéstia. Os alunos do ensino público pontuaram mais no engajamento escolar do que os do privado.


Outros estudos comprovam que autorregulação e perseverança (ou garra mais paixão) são mais importantes do que inteligência. A conhecida e boa esperança também está relacionada ao bom desempenho escolar.


Não é difícil entender esse tipo de resultado. A perseverança (ou garra mais paixão) é importante tanto para o comportamento em sala de aula - porque o/a aluno/a se comportará com diligência - quanto para o desempenho escolar - porque o/a estudante trabalhará persistentemente nas tarefas e nos deveres de casa, mesmo quando estes forem difíceis. Com isso, o/a aluno/a passa a ter mais possibilidades de ser bem sucedido/a nas tarefas escolares.


No que concerne à esperança, indivíduos esperançosos não são apenas caracterizados por acreditarem que um futuro positivo é possível, mas também por agirem de acordo com os resultados que desejam obter, a exemplo de conseguir um bom desempenho num exame escolar.

Outra força de caráter que pode servir para prever o comportamento e o sucesso na escola é o amor pelo aprendizado. Pessoas que têm essa força de caráter na assinatura experimentam emoções positivas ao aprenderem coisas novas e gostam de aprender sempre que possível. Frequentando uma escola, portanto, elas terão essa oportunidade diariamente. Possivelmente, esse amor pelo aprendizado as levará a ter emoções positivas associadas à aprendizagem, promovendo, adicionalmente, o bom desempenho escolar. Há várias escolas, em diferentes continentes, que trabalham com a educação positiva e algumas com enfoque nas forças de caráter. A Austrália foi quem primeiro iniciou o trabalho com educação positiva.


Duas escolas nos Estados Unidos foram as primeiras a se interessarem em trabalhar com educação positiva, a KIPP e a Rivedale. Ambas introduziram programas focados nas forças de caráter.


A Riverdale tem focado em trabalhar perseverança (ou garra mais paixão), otimismo, autorregulação, curiosidade, vitalidade, gratidão e inteligência social com seus alunos. Essas concepções fazem parte da cultura da escola e, consequentemente, das conversas entre estudantes e seus professores e entre professores e seus coaches. No Brasil, as forças de caráter na escola ainda estão engatinhando. Não existe nenhum trabalho do governo em direcionar a implementação das forças de caráter dentro da educação a fim de promover o treinamento dos professores para atuarem nesta área. Mas o governo estipulou, na Base Nacional Comum Curricular, a necessidade de as escolas terem uma educação sócioemocional. Existem iniciativas individuais, iniciativas em escolas particulares e públicas com empresas de consultorias já engajadas nesse processo. O Instituto Ayrton Senna, por exemplo, faz um trabalho nessa direção, bem focado em inteligência social.


Um pouco de história

A Educação positiva teve início quando o professor Martin Seligman foi convidado pela Geelong Grammar School (GGS) na Austrália a implementar a educação positiva naquela escola, que já estava arrecadando fundos para construir um centro de bem-estar. A escola objetivava estrapolar o ensino técnico e proporcionar a formação de estudantes mais felizes e mais preparados para a vida.


Seligman foi perguntado sobre o que ele faria se tivesse carta branca para criar uma educação positiva na GGS. Ele propôs, então, um treinamento em psicologia positiva, abarcando forças de caráter e resiliência, para todos os 200 professores e funcionários da escola. Além disso, sugeriu aulas com as figuras mais expressivas dentro da psicologia positiva. Ele também apresentou a necessidade de a escola ter um diretor integral em psicologia positiva e um curriculum de educação positiva.


Como consequência disso, em janeiro de 2007, Seligman e mais quinze estudantes seus de mestrado ministraram duas semanas de curso em psicologia positiva para todos os professores e funcionários da GGS. Todo o restante do processo transcorreu com Seligman lá até junho do mesmo ano.


Em outro momento, entre fevereiro de 2012 e 2014, Seligman morou em Adelaide, e em decorrência de seu trabalho lá, a educação positiva foi implementada como política pública em parte da Austrália.


Outro momento importante foi o trabalho liderado por um estudante de doutorado de Seligman, Alejandro Adler. Em 2011, ele desenvolveu com o governo de Butão um Curriculum Nacional de Felicidade Bruta a pedido do então ministro da educação. Esse estudo culminou na adoção de um currículo de educação positiva em todas as escolas do país. Adler, desde então, tornou-se um líder em educação positiva, tendo desenvolvido programas em diferentes países, a exemplo do México e do Peru.


E é assim que a educação positiva vem ganhando morada em diferentes continentes.



REFERÊNCIAS

Livros Boniwell I. & Tunariu, A. D. (2019). Positive Psychology: Theory, Research and Applications. London: Open International Publishing. Second edition.


Niemiec, R. (2018). Character Strengths Interventions. A Field Guide for Practitioners. UK: Orgrefe Publishing.


Peterson, C. & Seligman, M. (2004). Strengths and Virtues: A Handbook and Classification Hardcover. Washington, DC: Oxford University Press.


Seligman, M. (2017). Authentic Happiness: Using the New Positive Psychology to Realize Your Potential for Lasting Fulfillment. London: Nicholas Brealey Publishing.


Seligman, S. (2018). The Hope Circuit: A Psychologist's Journey from Helplessness to Optimism. New York: Public Affairs.


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